Ergonomia e qualidade de vida no trabalho da equipe de enfermagem: desafios e soluções

Funções de risco realizadas por esses profissionais podem ocasionar lesões permanentes, se não exercidas corretamente

Por

A equipe de enfermagem é primordial para o bom andamento do ambiente hospitalar. É ela quem implementa planos de cuidado, com atividades baseadas na ética e no acolhimento do paciente e seu acompanhante, tornando-se, assim, o cartão de visitas da instituição hospitalar.

Mas é a equipe de enfermagem também quem é acometida por diversas complicações de saúde relacionadas às suas funções. Marcio Moreira – membro da diretoria da Abergo (Associação Brasileira de Ergonomia) e da ABNT (Associação Brasileira de Normas Técnicas) para tradução das ISOs de Ergonomia –, acrescenta que “se trata de uma atividade importantíssima, com grande responsabilidade, porém com potencial de sobrecarga psicofísica que deve ser estudada frequentemente”.

Organizações nacionais e internacionais e grupos de pesquisa destacam a equipe de enfermagem como um grupo de risco em relação ao desenvolvimento de problemas dorsais e sugerem a utilização da ergonomia como estratégia fundamental de prevenção, cujo objetivo é otimizar o bem-estar e o desempenho geral de um determinado sistema no ambiente de trabalho.

Principais riscos antiergonômicos que profissionais de enfermagem estão submetidos

De acordo com estudos, certas posturas e movimentações feitas repetidamente pelo profissional, durante anos, pode afetar a musculatura e a constituição osteoarticular,  principalmente da coluna e dos membros, resultando até em lesões permanentes e deformidades. Marcio elenca as principais causas dessas ocorrências, que envolvem:

• movimentação de pacientes acamados e o esforço físico ao transportá-los;

• inadequação do mobiliário e equipamentos utilizados nas atividades cotidianas;

• manipulação de cargas pesadas;

• manutenção de posturas estáticas e impróprias;

• ritmo de trabalho acelerado;

• falta de recursos materiais e humanos;

• concentração de atividade excessiva;

• ocupação total da carga horária durante a jornada de trabalho e

• conhecimento insuficiente sobre ergonomia.

Dentre as demandas mencionadas acima, a movimentação de pacientes é a principal causa de lesões nas costas, mais especificamente na região lombar. “Todas as ações que exigem trabalho com movimentação dos pacientes oferecem maior risco para as estruturas humanas, isto porque nossa limitação para levantamento de cargas é de 23 quilos na melhor das hipóteses, segundo a ISO 11228-1 NIOSH. Empurrar e puxar, segundo a NBR 11228-2, também não deveria exigir grandes esforços, como definido pela ferramenta Liberty Mutual”, acrescenta Marcio.

Porém, a equipe de enfermagem tem o elemento surpresa como parte da rotina, onde a ação dela geralmente precisa ser imediata. “Muitas destas ações acontecem de forma emergencial e sem um planejamento adequado ou possibilidade de subdivisão dos esforços”, explica.

Um grande desafio para a gestão hospitalar

“A dor lombar continua a ser o fator principal de absenteísmo, incapacidade funcional e procura por auxílio médico entre esses trabalhadores”, comenta Marcio.

A ausência do funcionário é procedente de doenças provocadas por postos de trabalho inadequados e processos produtivos que infligem, principalmente, em repetições exaustivas, no uso da força física e em posições antiergonômicas.

Segundo Marcio, dentre os principais custos diretos e indiretos que a instituição pode enfrentar por conta de funcionários lesionados devido à sobrecarga física e psíquica, estão:

• aumento de absenteísmo;

•  aumento da rotatividade de pessoal;

•  afastamentos;

•  erros humanos;

•  acidentes;

•  quebra de equipamentos e

•  aumento de regulações e estratégias compensatórias.

As consequências são, além de altos custos para a entidade, a queda da qualidade de vida dos colaboradores lesionados e o atendimento precário a pacientes.

Investimento em ergonomia pode reduzir os custos da instituição

No projeto de sistemas mais complexos, como um centro de controle operacional de uma ressonância magnética, equipamentos de hemodinâmica, postos de enfermagem, a ergonomia é um dos fatores mais importantes para a redução de erros em atividades humanas e, consequentemente, na redução de acidentes.

Certamente a aplicação da ergonomia em instituições de saúde é uma prática que deve ser adotada. Não se trata apenas de adequar as condições de trabalho ao que diz a lei para evitar multas e outras sanções, mas, sim, de fazer com que a gestão hospitalar seja capaz de aprimorar a qualidade de atendimento e dos resultados, através de abordagens que conscientizem também os próprios profissionais da saúde.

Marcio Moreira lista os principais procedimentos relacionados ao tema, que estão sendo implementadas por hospitais, laboratórios e enfermarias nacionais durante os últimos anos, como por exemplo:

• equipamentos mais bem planejados para transporte de movimentação de pacientes;

• subdivisão dos esforços por dois ou mais profissionais;

• melhor organização do trabalho, permitindo rodízio em ações mais pesadas;

• otimização arquitetônica de prédios e locais destinados aos profissionais de saúde, como corredores, rampas, eliminação de degraus, elevadores de carga etc.

Com o propósito de formalizar e normatizar as ações ergonômicas para reduzir erros e acidentes, foram desenvolvidos regulamentos, leis e normas oficiais com o objetivo de estimular a sua aplicação. No Brasil, vale destacar algumas delas. “A ergonomia possui a NR17 (Norma Regulamentadora 17), que possui elencados pontos relativos ao transporte e movimentação de cargas, mobiliários, equipamentos e dispositivos, aspectos organizacionais e ambiência. Também pode-se consultar a [Norma Técnica ISO] 12296, específica para o transporte e manuseio de pacientes. Não obstante, deve-se considerar as NBRs 11228-2, 11228-3, 20646, 11226, 7250 e ISOs 11228-1 e 10075”, esclarece.

Muitas realidades em um único País

É difícil ilustrar uma situação que hospitais e profissionais enfrentam ao se comparar hospitais públicos e privados e as regionalidades de um país tão grande quanto o Brasil. Como Marcio pontua, “a NR17 se refere a uma norma geral, que deveria ser seguida por trabalhadores da área pública e privada, todavia existem diferenças importantes entre estas duas áreas, que se agrava dependendo da região, estado, município. Muitos hospitais são ricos e prósperos, investindo fortemente em ergonomia e segurança; outros são pobres, sem recursos e completamente atrasados no ponto de vista ergonômico. Temos um País de dimensões continentais, com Estados mais ricos, outros pobres, regiões inseridas no meio da Floresta Amazônica, no sertão mais afastado dos grandes centros e normalmente estes hospitais ou mesmo enfermarias são públicas”.

Equipe também precisa estar a par dos riscos a que está submetida

É fundamental que o próprio profissional esteja ciente que certos riscos ocupacionais possam gerar lesões osteomusculares e, assim, tentar preveni-las com orientações ergonômicas e posturais, tais como: técnicas adequadas de levantamento; manuseio e transporte de cargas e equipamentos; movimentação, transporte e preparo de pacientes e preparo do ambiente e de equipamentos.

Ademais, é importante que o profissional faça atividades físicas regularmente; evite a obesidade e o tabagismo e utilize posições, colchões e travesseiros adequados para dormir. 

Compartilhar

Facebook
Twitter
WhatsApp

RECOMENDADAS PARA VOCÊ